Por Alessandra Marins
Em 2011 quando terminei de escrever “De onde vêm as tendências”, um estudo realizado exatamente para entender qual a relação do que vestimos e dos tempos que vivemos, fiz o paralelo com a influência do filme Mad Max, a tendência militar e as coleções lançadas nos desfiles de moda. Com a nova edição do filme e continuação das pesquisas, vale rever a influência do militar e como ele volta neste momento.
Volta e meia, o militar é uma tendência que está na moda. Se analisarmos os momentos políticos e econômicos no mundo ao longo dos últimos sessenta ou setenta anos, o modo como a tendência é lançada está diretamente conectado com os fatos correntes no respectivo momento.
A primeira aparição do militar na moda foi nos anos 1940, exatamente quando acontecia a Segunda Guerra Mundial. Estamos falando de tempos difíceis, quando os homens foram recrutados para a guerra e as mulheres entraram no mercado de trabalho. O tecido rústico verde oliva era o mais barato e mais disponível na época, o que fez com que as mulheres o empregassem para fazer seus trajes de trabalho. O tailleur da época ganhou um estilo de uniforme.
A tendência militar reaparece nos anos 1960, quando o uniforme é usado na moda como forma de manifestar justamente o sentimento antiguerra. Os anos 1960 caracterizaram-se pelos movimentos hippies que influenciaram e foram influenciados pelo rock, pelo estilo de vida referenciado pela transgressão, pelo amor livre e pelo uso de drogas. Isso acontecia em um momento econômico em que os EUA ofereciam mecanismos de amparo social do Estado para jovens desempregados. O rock contribuía com o engajamento dos jovens nas questões sociais e políticas. A música era cantada em protesto contra a guerra do Vietnã, na luta pelas campanhas de liberdade. Nesta época, o estilo militar começa a ser usado pela cultura pop como na capa do disco dos Beatles, pois John Lennon era um dos grandes protestantes contra a guerra.
Em 1990, o militar volta muito forte, só que desta vez usado junto com a tendência grunge (também originada no rock do Nirvana, de Kurt Cobain), misturando-se às camisas de flanela xadrez, aos jeans surrados e aos tênis All Star.
Após setembro de 2001, com a queda das torres gêmeas, as coleções de inverno foram desenhadas com muitos trenchcoats e casacos no estilo militar. Note que o trenchcoat é originalmente o casaco de trincheira usado pelos oficiais do exercito inglês criado por Tomas Burberry em 1879 com um tecido de gabardine para proteger da chuva e que entrou para moda a partir dos anos 1930. O mundo vivia momentos de profunda tristeza e, ao mesmo tempo, os EUA mantinham o discurso de grandeza. Apesar de terem sofrido os ataques que comoveram grande parte do mundo, eles ainda se colocavam firmemente como uma grande potência, autoafirmando-se o tempo todo. Nas coleções de inverno daquele ano, havia muitos uniformes na cor preta, com uma profusão de adornos em dourado, como se afirmassem o poder por meio do vestuário.
Em 2010, o militar ataca novamente com a marca francesa Balmain, naquele momento desenhada por Christopher Decarnin. Note que Balmain é uma marca francesa de luxo criada em 1945 por Pierre Balmain. Em 2006 francês Christopher Decarnin, de 44 anos, assumiu o estilo da marca, trazendo um olhar para a mulher jovem, rebelde e sedutora. Desta vez, vem o militar com camisetas e calças rasgadas, com tecidos amassados e uma campanha produzida com imagens de jipes no meio da floresta. Um editorial do Net-a-Porter compara a campanha com o filme Mad Max, que mostra uma civilização destruída no futuro, onde surge uma sociedade no meio de um imenso deserto.
A tendência militar de 2010 deixa de ser o militar ostentador que precisa afirmar o poder e passa a ser uma tendência militar sobrevivente, lutando pelas terras, lutando pela água. Assim, podemos ver um casaco sem adornos se tornando um casaco com tecido amassado e rasgado.
Em 2015 a nova versão do filme Mad Max é lançada e podemos ver novas referências para moda. Desta vez o filme inspirou a beleza. Indicado a dois Globos de Ouro, a obra apresentou um elenco dinâmico de mulheres que impactou as ruas e os desfiles. Com duas estrelas no elenco, Charlize Theron e Zoë Kravitz, a beleza das tribos de Mad Max passou de tela grande para o mainstream.
* Este texto faz parte da pesquisa de Alessandra Marins, que deverá ser editada como livro.